Exmo.
Sr. Ministro da Educação
Senhor
Presidente da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura
Exmo. Sr. Secretário de Estado do Ensino Superior
Exmo.
Sr. Secretário de Estado do Ensino e Administração Escolar
Exmo.
Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário
Senhor
Presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas
Senhor
Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos
Senhores
Diretores Gerais
Senhores
Presidentes do Conselho Nacional de Educação
Senhores
Conselheiros
Minhas
Senhoras e meus Senhores
O
Conselho Nacional de Educação completou no passado mês de Abril 31 anos sobre a
data da sua criação. Trata-se de uma instituição que só aparentemente se
apresenta como produto do regime democrático. As suas raízes vão bem mais
longe. O CNE é o herdeiro direto do Conselho Superior de Instrução Pública,
decretado por Rodrigo da Fonseca Magalhães em 1835, mais tarde substituído pelo
Conselho Geral de Instrução Pública de Fontes Pereira de Melo, a que se
sucederam a Junta Consultiva da Instrução Pública criada pelo Duque Loulé e, já
no século XX, a Junta Nacional de Educação de Carneiro Pacheco.
Esta
genealogia institucional não pretende ser uma expressão de alarde da sua
antiguidade. Os pergaminhos por si só não resolvem problemas nem superam
desafios. Porém, conferem aos membros do CNE uma responsabilidade acrescida no
desempenho da sua missão e ensinam-nos a perceber que o tempo das instituições
é bem mais extenso e mais denso que o tempo apertado e quantas vezes efémero,
dos ciclos políticos.
Fiz
questão de ter presentes nesta sessão os antigos presidentes do Conselho Nacional
de Educação. Eles representam, na diversidade das suas ideias, dos seus
inestimáveis contributos para a educação em Portugal e dos seus estilos de
direção do CNE, a identidade de uma instituição respeitada e de que nos podemos
orgulhar.
Aos
Professores Mário Pinto, o primeiro Presidente do Conselho Nacional de
Educação, Barbosa de Melo, Eduardo Marçal Grilo, Manuel Porto, Júlio Pedrosa e
Ana Maria Bettencourt, devo uma palavra de agradecimento e de público
reconhecimento pela forma como souberam valorizar esse legado. À memória da
Professora Teresa Ambrósio, curiosamente a presidente do CNE com quem tive a
honra de colaborar, quero também expressar o meu tributo saudoso de amizade e
agradecimento.
O
Conselho Nacional de Educação, quer pelo seu estatuto, quer pela sua dimensão
institucional, tem a obrigação de se afirmar para além das conjunturas
políticas e de resistir ao combate ideológico que alimenta as páginas e os
ecrãs dos media.
É tão
grave que o CNE se deixe condicionar pelas estratégias políticas dos governos,
quanto se assuma como instrumento de oposição a esses governos,
independentemente das cores que o possam reger. Ao fazê-lo estará a pôr em
causa o legado institucional que lhe é transmitido, bem como o papel de
interlocutor privilegiado na reflexão e na concepção das políticas educativas
que lhe é exigido.
Ninguém
nos pede que sejamos neutros, mas é indispensável que sejamos isentos. Ninguém
nos pede que silenciemos a opinião, mas seremos mais respeitados se a
fundamentarmos de forma rigorosa com base na análise criteriosa da informação
disponível. Ninguém nos pede que resolvamos os problemas do sistema de ensino,
mas é urgente que possamos congregar esforços no sentido de ajudar a encontrar
novos caminhos.
De há
muito que a concepção primitiva de aconselhamento do Ministro da Educação foi
alargada, assumindo-se hoje como órgão de aconselhamento do Estado em todas as
matérias relativas à educação.
Neste
particular domínio, importa acrescentar às relações privilegiadas com o
Ministério da Educação e Ciência, as que pretendemos consolidar com a
Assembleia da República, em particular com a Comissão de Educação, Ciência e
Cultura, e as que nos dispomos reforçar com a Presidência da República.
A
multiplicidade de órgãos consultivos, de coordenação e de avaliação no domínio
da educação exige ainda um contacto muito próximo e uma disponibilidade
colaborativa que permita potenciar o contributo de cada um. Refiro-me ao
Conselho das Escolas, ao Conselho Coordenador do Ensino Superior, ao Conselho
de Reitores das Universidades Portuguesas, ao Conselho Coordenador dos
Institutos Superiores Politécnicos, ao Conselho Nacional de Ciência e
Tecnologia e outras instituições públicas, especialmente as vocacionadas para a
avaliação do sistema de ensino, como é o caso da Agência de Avaliação e
Acreditação do Ensino Superior e do Instituto Público de Avaliação Educativa.
Trata-se
de ume rede de organismos públicos suficientemente diversificada que importa
cuidar de forma a evitar esforços duplicados. Nesta perspectiva, entendemos que
a cooperação franca e regular é a única via susceptível de preservar a
identidade de cada uma das instituições e, simultaneamente, de valorizar cada
um dos seus contributos.
O
Conselho Nacional de Educação é, pela sua natureza e composição, um Conselho de
parceiros representativos das diferentes atividades e da diversidade de papéis
sociais que se desenrolam no vasto e complexo palco da educação. É por isso
natural que aqui estejam presentes as múltiplas concepções do que se entende e
do que se pretende da educação das novas gerações. Mais do que um obstáculo,
essa multiplicidade representa um capital que urge valorizar e agregar,
nomeadamente pelo potencial que encerra no domínio da concertação.
Foi
neste contexto que recorri à ideia da “Casa Comum da Educação” para identificar
um desígnio em que uma larga maioria se possa rever e sentir.
Como
Presidente do CNE revejo-me no papel simbólico de “construtor de pontes”, como
tive oportunidade de me apresentar aos Senhores Deputados da Comissão de
Educação, Ciência e Cultura. Alguém que pretende ligar as margens, respeitando
a sua identidade, mas garantindo que o rio continua a correr e as suas águas a
fertilizar o trabalho dos homens e mulheres deste país.
Dirão,
meus caros amigos, que poderei pecar por excesso de ingenuidade e de algum
idealismo utópico. Mas podem crer que só pecados destes me retirariam do recato
da família e da recompensa de uma profissão de professor e investigador que
continuo a amar como se fosse a única possível. Este é um dos poucos desafios públicos
que vale a pena enfrentar.
Todos
nós temos uma ideia do que pretendemos para a educação dos nossos filhos. Resta
saber se o País tem uma ideia do que pretende para a educação das novas
gerações. É esta dúvida que me leva a crer que há falta de sentido de futuro
para a educação em Portugal.
Não
faltam diagnósticos, não faltam medidas nem propostas, não faltam ideias nem
concepções ideológicas, não faltam debates nem polémicas. Neste particular
aspecto somos claramente excedentários.
O que
nos falta é uma base de convergência sobre alguns objectivos a atingir e uma
estratégia de longo prazo que não tem estado ao alcance da alternância
política. Falta-nos cultura de compromisso que nos liberte da tensão do
imediato e permita conferir continuidade e estabilidade às políticas
estruturantes do sistema educativo.
Este
é o meu quadro de referência para o mandato que agora inicio.
Senhor
Ministro da Educação e da Ciência, permita-me que aproveite a sua presença que
muito nos honra para lhe dizer que compreendo as dificuldades e os desafios que
tem pela frente. Eu sei o que é governar na adversidade e na escassez de
recursos financeiros. Não terei a experiência de governar num país que está sob
resgate dos credores internacionais e por vezes estranho que existam pessoas
que ainda não perceberam as consequências desta particular conjuntura.
Entendo
que em educação, como em tantas outras atividades públicas, nem toda a despesa
é investimento e que a boa vontade não ponderada se paga mais tarde com
sacrifícios. É mais fácil corrigir os excessos de boa vontade do que os
excessos dos sacrifícios, principalmente se estes se saldarem em perdas
irreversíveis para o funcionamento e a missão das instituições.
É
esse limiar que importa acautelar de forma a que as dívidas do passado não se
transformem em hipotecas do futuro.
Meus
caros membros do Conselho Nacional de Educação.
Vamos
ter oportunidade de aprofundar a reflexão e o debate em torno das questões
centrais do desenvolvimento do sistema educativo. Tenho uma proposta de agenda
para o debate dessas questões na qual não poderemos deixar de incluir a
atividade central deste conselho que é o de emitir pareceres e recomendações,
bem como o de avaliar as políticas educativas.
Espero,
até ao final do presente ano civil, apresentar-vos uma proposta de
reajustamento das comissões especializadas permanentes que considere essa mesma
agenda e que nos permita responder a três questões entre as muitas que decerto
identificaremos como centrais.
Como vamos preparar as
novas gerações para a sociedade do conhecimento?
Por
vezes deslumbramo-nos com o potencial da utilização das novas tecnologias de
informação e de comunicação e esquecemo-nos de que o fundamental em educação é
o conhecimento e o saber pensar os problemas.
O
conhecimento escolar é uma particular combinatória de conhecimento científico e
cultural, de pedagogia e de senso comum. Porém, algo vai mal quando confundimos
cada um desses três pilares e, pior ainda, quando desvalorizamos o primeiro em
detrimento dos outros dois.
Não
há pessoas competentes se não forem cultas e se não dominarem os conceitos e as
maneiras de pensar. Por isso entendo que teremos de valorizar a cultura
científica em todos os níveis de ensino, desde os mais elementares do básico
aos mais avançados do superior. Esse é, como bem lembra Michael Young, o
“conhecimento poderoso” que sustenta o desenvolvimento social e concretiza os
princípios da liberdade e da equidade.
Educar
é capacitar e nesse processo complexo que são as aprendizagens - afinal o
verdadeiro centro do processo educativo - o papel do professor é decisivo porque
é ele que vai combinar esses três pilares do conhecimento escolar.
Daqui
surge a segunda questão:
Que perfil de formação
exigimos aos nossos professores?
Não
me restrinjo à formação inicial. Prefiro falar da “condição docente”, expressão
que pretende ir além de saber o que é que um professor faz, mas que se centre
no que o professor é. Torna-se urgente entender essa condição docente desde a
formação inicial, à profissionalização, passando pela formação contínua, pela
carreira e pela avaliação do seu desempenho.
Um
professor não é só um profissional da pedagogia é também um profissional do
conhecimento.
O
Estado e, por maioria de razão, a escola pública tem o direito e o dever de
escolher os melhores e de lhes proporcionar as condições, os recursos e a confiança
que lhes permita ganhar esse desafio do futuro.
Trata-se
de construir uma nova visão que não a temos mas que urge identificar para que
nos possamos orientar e preparar para os tempos que se avizinham.
Será que a atual Lei de
Bases do Sistema de Ensino dá resposta a estas questões?
A
experiência ensina-nos que em educação nada se constrói de novo, como se tudo o
que existe de pouco contasse. Ensina-nos também que neste mundo globalizado não
existem soluções milagrosas e suficientemente inovadoras que nos permitam
traçar uma rota que outros já não tenham esboçado.
Por
isso a resposta à questão terá de ser ponderada e fundamentada, não dispensando
um estudo aturado e sistemático da forma como tem sido concretizada essa Lei de
Bases. Não compete ao Conselho Nacional de Educação tomar a iniciativa de a
rever, revogar ou manter. Mas compete-nos produzir o conhecimento necessário de
forma a preparar quem de direito queira responsavelmente assumir essa decisão.
Uma
lei de bases pode e deve ser um instrumento de orientação e desenvolvimento das
políticas públicas de educação. Pode e deve ser a consagração pela norma dessa
visão que podemos construir e desse compromisso que urge alcançar.
Se
não o fizermos, ou pelo menos, se não o tentarmos, arriscamo-nos a que as
gerações vindouras nos interpelem sobre a responsabilidade que temos e que nem
sequer a assumimos.
Eu
não desejo que os meus filhos e os meus netos me apresentem essa conta!
O que se pede ao CNE não é discursos de subserviência ao poder. O que se pede é que trabalhe na defesa do interesse dos alunos e do futuro do país. O futuro é a educação.
ResponderEliminarNo pior momento de sempre da nossa educação depois da democracia o CNE tem um papel fundamental. Ler este discurso deixa a ideia de que prefere a abstenção, o silêncio cúmplice perante as más medidas e quiçá mesmo alguma porta aberta a maiores ataques aos alunos com mais necessidades e à escola pública e aos seus professores.
O desafio perante o CNE é o de evitar e inverter a tendência de reprodução social que se está a acentuar no sistema educativo com as medidas deste ministério. É promover um financiamento sustentado que não alimente lucros privados e interesses obscuros na mais nobre das funções do estado.
Bom trabalho.